Kayany Gomes, 9, quer ser cantora quando crescer e, agora, pode aprender mais sobre a profissão nas aulas de canto da ONG Instituto Baccarelli, localizada em Heliópolis, zona sul de São Paulo.

Heliópolis é formada por uma favela principal e por comunidades menores vizinhas. Juntas, as comunidades formam o segundo maior conjunto de favelas de São Paulo, com mais de 60 mil habitantes.

A menina não conseguia frequentar as aulas antes, que são gratuitas, por não ter como ir até o local. A distância de sua casa até a ONG é de 3,2 km, por isso ela precisaria usar o transporte público, o que a mãe, Maria Aparecida da Conceição, não tem condições de pagar.

“Devido à distância, se eu começasse a levar ela, eu teria que pagar a condução não só para mim, mas também para ela, né? Como ela já tem nove anos, seriam duas conduções a mais, e eu não teria condições”, conta a mãe.

Em 2013, o contrato com a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo liberou para o Instituto Baccarelli 1.300 vagas para os programas de musicalização infantil e coral, com foco em crianças de 4 a 14 anos da rede municipal de ensino. Mas muitos desses alunos não tinham como ir à ONG.

  Até a chegada do “Buscarelli”, como foi apelidado o ônibus do instituto.

Em setembro, antes do lançamento do “Buscarelli”, apenas 870 das vagas estavam preenchidas (430 permaneciam em aberto). Em menos de dois meses após o lançamento do ônibus, os inscritos subiram para 1.009. Agora, restam apenas 291 vagas.

Há uma semana, o ônibus passou a atender crianças de todas as idades – no início, a idade limite era de 10 anos. A expectativa é que a procura aumente ainda mais e que as crianças e adolescentes acima de 10 anos que haviam preenchido as fichas, mas aguardavam a liberação do transporte, estejam matriculadas até o início do ano que vem.

Caminhada de 30 minutos

O filho mais velho de Conceição, Kelvin Gomes (14), utiliza o passe escolar para cursar o colegial na Escola Técnica Estadual de Heliópolis, que fica a 3,6 km de distância da casa da família.

Mesmo assim, às vezes, a renda da operadora de máquina não é suficiente para o mês inteiro e Kelvin tem de encarar cerca de 30 minutos de caminhada até a escola. “Força mais as minhas pernas, aí eu fico meio cansado. Às vezes eu fico com dor”, diz o menino.

Kelvin não se inscreveu para tentar uma vaga no curso técnico de informática, também oferecido pela sua atual escola, já que as aulas seriam em período integral, impossível para ele, já que leva Kayany à escola, ou no período noturno, o que significariam mais duas conduções.

“Acaba perdendo grandes oportunidades porque não tem como se locomover”, lamenta Conceição.

Transporte escolar

Segundo a Constituição, o Estado deve garantir o acesso ao transporte escolar em todas as etapas da educação básica.

A Prefeitura de São Paulo e a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo informaram que a legislação estabelece que possam ser atendidos no Programa de Transporte Gratuito Escolar (TEG) alunos de até 12 anos de idade, que, na impossibilidade de atendimento próximo à residência, residam a mais de 2 km da unidade escolar de matrícula. O aluno com idade a partir de 12 anos será atendido por meio de passe escolar.

Também são atendidos os alunos com deficiência ou necessidades especiais e os que possuam problemas crônicos de saúde, independentemente da idade.

Já a assessoria do Centro Paula Souza informou que não há transporte para os alunos de suas Escolas Técnicas Estaduais (Etecs) e Faculdades de Tecnologia do Estado (Fatecs), apenas o direito ao passe escolar.