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Mesmo que liberem o jovem da viagem, os pais devem manter contato intenso enquanto estiverem fora
Chega um momento na vida de uma família em que os jovens não querem mais viajar com os pais. Os motivos vão desde a vontade de ficar com os amigos até o fato de não curtirem o roteiro escolhido. Alguns são mais flexíveis e, mesmo reclamando, topam fazer a vontade dos adultos. Outros, porém, batem o pé a ponto de transformar os preparativos para a viagem em discussões intermináveis.
Pais e mães se veem diante de um dilema: forçar o adolescente a passar dias a fio emburrado ao lado deles ou acatar o pedido do filho e partir sob a culpa de se achar liberal demais e com a cabeça cheia de preocupações.
Em primeiro lugar, é bom nunca esquecer que a adolescência é uma fase de rebeldia e oposição. O desejo de independência e as flutuações de humor tornam esse período um desafio e tanto, para os jovens e para os pais.
“A viagem de férias em família pode significar, para essa faixa etária, o controle dos adultos, já que são eles, os pais, que definem onde, quando e como acontecerá o passeio. É justamente um controle do qual o jovem, em nome de sua própria autonomia, quer se libertar”, afirma a psicóloga Elisa Villela, doutora em desenvolvimento humano pela USP (Universidade de São Paulo).
No entanto, o adolescente ainda depende dos pais, econômica e afetivamente, e por isso sentimentos contraditórios entram em jogo: querer e não querer estar com a família, desejar e ignorar seus cuidados. Na opinião do terapeuta familiar e de casal Marcelo Lábaki Agostinho, psicólogo responsável pelo Sefam (Serviço de Atendimento a Famílias e Casais) do IP (Instituto de Psicologia) da USP, essa é uma ótima oportunidade para os pais perceberem que o filho está crescendo e mostrando que quer maior autonomia.
“O pedido do adolescente para não viajar com a família é uma forma de comunicar que ele está se diferenciando dos pais e ficando mais independente. Vale a pena aproveitar as circunstâncias para conversar sobre a autonomia que o adolescente quer ter e a que, de fato, tem”, declara Agostinho.
Diálogo
Antes de confrontar o filho “do contra”, os pais precisam investir no diálogo e tentar entender e considerar suas razões. Deve-se evitar cair em extremos, como não escutar o adolescente e impor sua participação na viagem ou, no caminho inverso, liberá-lo completamente no estilo “está bem, faça o que quiser”.
“Essa segunda posição não leva em conta a necessidade de cuidado do adolescente e pode colocá-lo em situação de risco ou de angústia”, fala a psicóloga Elisa Villela.
A decisão também tem a ver com os princípios e ideais da família. Portanto, de acordo com a terapeuta familiar e mestre em psicologia Edith Rubinstein, os pais devem ter firmeza ao justificar e argumentar a razão e a importância da viagem em família para que o adolescente possa entender os seus valores.
“É necessário mostrar que é o momento para ficar perto dos pais, irmãos ou outros parentes, pois é uma oportunidade única no ano, e que existirão outros períodos para aproveitar ao lado dos amigos”, afirma Edith. “Se a viagem foi planejada há muito tempo, e o adolescente sabia disso e concordava, e de uma hora para outra, decide não ir, os pais devem se impor e fazê-lo cumprir com o que havia sido combinado”, fala a neuropsicanalista Prisicila Gasparini Fernandes.
Autonomia e responsabilidade
Segundo a psicopedagoga Luciana Barros de Almeida, vice-presidente da ABPp (Associação Brasileira de Psicopedagogia), para saber se um jovem tem maturidade suficiente para ficar sem a presença dos pais, ele deve, em primeiro lugar, ser capaz de cuidar de si mesmo quanto à higiene e à alimentação. “Depois, precisa ter espírito de coletividade para colaborar com a rotina do local onde ficará hospedado e ser capaz de acatar regras”, afirma.
De acordo com Edith Rubinstein, os pais percebem a maturidade nos filhos pela convivência. “No dia a dia, nas conversas, é possível perceber com quem se relacionam, como se comportam, se sabem seus limites e se têm autocontrole e senso de responsabilidade”, afirma.
É fundamental definir um lugar seguro onde o adolescente possa ficar na companhia de adultos que assumam o compromisso do cuidado nesse período de ausência. Pais e mães não devem abrir mão de estabelecer limites e condições para esse período, seja com avós, parentes ou amigos responsáveis.
A recomendação dos especialistas é nunca deixá-los sozinhos, mesmo na própria casa, porque isso esbarra, inclusive, em questões legais. O Código Penal brasileiro prevê o crime de abandono de incapaz, em que pode ser enquadrado o ato de deixar o filho menor de idade sem a supervisão de um adulto.
É importante informar e dar autoridade aos cuidadores temporários sobre regras em relação a horários, programas etc. Mesmo com os filhos nas mãos de pessoas de confiança, é importante que os pais se mantenham informados e em comunicação com o jovem via telefone ou virtualmente (Skype, Facebook, e-mail).
Muitos podem até reclamar desse controle à distância, mas, segundo a psicóloga Elisa Villela, a maioria sente alívio com a lembrança e a preocupação. “Porém é preciso não exagerar na quantidade de vezes dos contatos e ligações, pois, em excesso, perturbam e dão a sensação de falta de confiança”, diz Luciana.