A organização não governamental (ONG) Justiça Global lançou hoje (5) uma campanha para tentar sensibilizar a população e as autoridades brasileiras para a necessidade de redução da quantidade de presos provisórios que aguardam julgamento. Defensora de mudanças nas políticas de segurança, a entidade sustenta que as prisões temporárias se tornaram fontes de inúmeras violações de direitos humanos, como o encarceramento prévio de suspeitos sem condições de contratar bons advogados e a consequente superlotação de presídios.
“A quantidade de prisões provisórias no Brasil é alarmante”, afirmou à Agência Brasil a diretora executiva da Justiça Global, Sandra Carvalho. Segundo ela, dados oficiais apontam que cerca de 230 mil das 560 mil pessoas presas em todo o país ainda não foram condenadas. Embora encarceradas provisóriamente, algumas aguardam meses e até anos pela sentença. De acordo com os números, são vários os casos em que o suspeito ou é inocentado ou, quando condenado, já passou do tempo de ser posto em liberdade. Por conta da superlotação de cadeias e presídios, os acusados que aguardam julgamento muitas vezes dividem celas com pessoas já condenadas, não raramente por crimes violentos ou envolvimento com organizações criminosas, o que fere a Lei de Execução Penal, que exige a separação.
Além disso, o decreto de prisão preventiva muitas vezes é pautado por preconceitos de raça e classe, conforme apontou o relator da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (Cidh), da Organização dos Estados Americanos (OEA), James Cavallaro.
“Na América, quem tem mais chance de responder a acusações em liberdade é quem tem condições econômicas e meios de contratar bons advogados. Enquanto isso, os pobres são lançados na cadeia sem condenação”, afirmou Cavallaro à Agência Brasil.
Em relatório concluído em dezembro de 2013, com base em informações de 2012, James Cavallaro ressaltou que o recurso às prisões provisórias como política punitiva é crônico em praticamente todos os países do Continente Americano. Acrescentou que, no Brasil, os presos provisórios ultrapassam os 40% da população carcerária. Na Bolívia e no Paraguai, ultrapassam os 70%.
“A lógica está totalmente errada. Essas prisões violam os direitos humanos e ferem normas internacionais vinculantes, das quais o Brasil e outros países são signatários. Em vez de ser um instrumento de exceção, aplicado apenas quando há o risco de o acusado fugir ou obstruir o processo, a prisão provisória vem sendo usada como regra, pois muitos juízes temem que o réu fuja ou cometa outro crime enquanto responde ao processo em liberdade”, observou Cavallaro, argumentando que o receio não justifica o descumprimento ou a relativização das leis.
Sem detalhar propostas para mudar esse cenário, o relator da Cidh sugeriu a possibilidade de mudanças legislativas, conforme defende a Justiça Global. “Cada país é livre para escolher como fazer isso, mas deve encarar a questão e observar as normas internacionais”, assinalou James Cavallaro.
Uma das propostas defendidas pela Justiça Global é a implementação da audiência de custódia, com a qual todo preso terá de ser prontamente apresentado a um juiz para análise da legalidade da prisão. A organização também cobra o cumprimento da Lei 12.403/2011, que determina a aplicação da prisão provisória apenas em último caso.