Ao iniciar na semana passada o julgamento de ação ajuizada pela Ordem dos Advogados do Brasil, o STF sinalizou a intenção de vetar, por inconstitucionais, as doações eleitorais de empresas, além de impor limites às contribuições de pessoas físicas a candidatos. Tramita na Câmara um projeto que se ajusta como luva ao veredicto insinuado no placar parcial do Supremo. Mas essa proposta não deve nem ser votada.

Chama-se Henrique Fontana (PT-RS) o signatário do projeto que não entusiasma a Câmara. O deputado reproduziu no texto ideias defendidas pelo movimento Eleições Limpas, o mesmo que elaborou a Lei da Ficha Limpa. A proposta prevê o banimento do dinheiro de empresas do financiamento das campanhas. E fixa em R$ 700 o teto das doações feitas por pessoas físicas. Hoje, cada cidadão pode doar até 10% de sua renda bruta.

As providências ornam com os votos de Luiz Fux, Joaquim Barbosa, Luis Roberto Barroso e Dias Toffoli, os quatro ministros do STF que já se pronunciaram no julgamento da ação da OAB. Destoam, porém, da vontade média da Câmara. A maioria dos deputados não parece disposta a abrir mão da presença da caixa registradora das empresas nas suas campanhas.

Nesta terça (17), a Câmara deve instalar a comissão especial incumbida de analisar a chamada ‘PEC da reforma política’. É por meio dessa proposta de emenda à Constituição que o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), pretende salvar as arcas das campanhas do que chamou de “intromissão indevida” do STF. Elaborada por um grupo de trabalho coordenado pelo deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), a PEC vai na contramão do projeto de Fontana.

Longe de extinguir, o texto feito sob a coordenação de Vaccarezza empurra para dentro da Constituição o financiamento empresarial das campanhas. Sugere um modelo híbrido de coleta de fundos eleitorais —seria privado, público ou misto. Cada partido indicaria sua preferência antes das eleições.

O projeto de Fontana também inclui dinheiro público. Define limites de gastos para as campanhas de presidente, governador, senador e deputado. O candidato cuja soma das doações de até R$ 700 de pessoas físicas não atingisse o teto poderia ser socorrido por um fundo eleitoral público, abastecido com verbas do Orçamento da União.

Em entrevista ao blog, Henrique Alves, o presidente da Câmara, esconjurou a movimentação do STF. Fontana, ao contrário, disse considerar “extremamente positivo o sinal que está saindo do STF”. Por quê? “Hoje, temos um sistema político totalmente desigual e elitizado pela força do dinheiro privado.”

Henrique Fontana atuou por dois anos como relator de uma frustrada proposta de reforma política. Numa tentativa vã de levar a proposta ao plenário, o deputado ajustou seu texto dezenas de vezes. A despeito disso, o projeto foi enterrado por falta de acordo. O novo projeto pode ter o mesmo destino.