“E se Schumacher não existisse?”

Foi um exercício que, jornalistas cobrindo a F-1, praticamos por anos. Normalmente, uma resposta àquela cantilena de que “na época de Senna, Piquet, Prost e Mansell era muito melhor”.

Não que não fosse. Acho até que era mesmo. Mas o exercício valia. Como diversão, como provocação e como uma maneira de dar a merecida dimensão aos feitos do ferrarista.

Pegue os sete Mundiais que Schumacher venceu: 1994, 1995 e de 2000 a 2004. Exclua o alemão. O que teríamos? Batalhas acirradas pelo título. Campeonatos épicos. Duelos históricos.

Hoje, lembraríamos com saudades daqueles confrontos Hill x Berger x Hakkinen x Alesi. Ou Hakkinen x Coulthard x Barrichello x Fisichella. Ou Barrichello x Montoya x Coulthard x Raikkonen.

Mundiais decididos na ponta do lápis, nas etapas finais, nos mínimos detalhes. Recordes batidos, brasileiro campeão do mundo, ah, que maravilha.

Mas não. Nada disso houve. Schumacher existiu. E era muito superior a todos. Colocou todos no bolso. Desequilibrou.

Um extraterreste.

O exercício se encerrava com outra pergunta. “Será que aqueles anos dourados só o foram porque não havia um ponto de desequilíbrio?”

Senna, Piquet, Prost e Mansell eram pilotos sensacionais, claro, mas o que ficou mais marcado para o grande público, o que é mais louvado, é o resultado do equilíbrio entre eles.

Seriam os quatro igualmente extraterrestres? Ou nenhum deles o era?

Um achismo: se Schumacher corresse naquele final de anos 80, lembraríamos hoje de sensacionais confrontos a cinco. Uma opinião: ele não pode ser culpado, ou ter os feitos diminuídos, por ter se destacado tanto em sua época, por ter sido o único extraterrestre de sua geração.

Outros três fatores contribuem para que seu status de mito não seja unanimidade. Começa pela forma como ele conquistou o primeiro Mundial, jogando o carro para cima de Hill. Depois, a forma como ele conseguiu boa parte das 91 vitórias: na base da estratégia –e nunca vou esquecer do GP da França de 2004, que ele ganhou fazendo quatro pit stops.

Por fim, há no Brasil um ranço pelo fato de o alemão ter sido o “próximo Senna”. Sentimento só agravado pelos anos em que ele foi companheiro de Barrichello e impôs seu status de número 1 –da mesma forma como o tricampeão fez com Berger nos anos de McLaren, privilégio registrado em contrato.

Talvez Schumacher receba parte do reconhecimento agora, entrevado num leito de hospital. É da natureza humana. Mas que ele se recupere para gozar isso. E que, daqui a um ano, possa comemorar seu aniversário de 46 anos com a família, dando risada de tudo isso.

Feliz aniversário, Michael.