Uma análise que apresenta em suas conclusões que o ensino de sociologia e filosofia diminuiu a eficiência do ensino de matemática, a princípio deveria ser deixada em sua própria irrelevância e inconsistência.

Mas essa manifestação, na realidade um manifesto, precisa ser vista mais de perto.

Publicada na grande mídia, legitimada pelas credenciais acadêmicas de quem escreve, trata-se da opinião de defensores do escola sem partido. É a opinião do assessor econômico do candidato à presidência que está sendo processado por racismo, homofobia e incitação ao estupro.

Trata-se da opinião de uma pessoa que o Ministério da Educação preferiu não mantê-lo entre seus quadros por considerá-lo “muito à direita”!

Não se trata de uma análise acadêmica.

O argumento de que a oferta de sociologia e filosofia no ensino médio resultou na piora no desempenho dos alunos em avaliações como ENEM, por exemplo, supõe que o ensino e o aprendizado de matemática têm uma dinâmica que se esvazia se alunos entram em contato com outras informações e com outro universo de adensamento intelectual.

Segundo os autores, não foi o ensino de química e física; não foi o ensino de literatura ou de inglês; mas sim a presença da sociologia e da filosofia que “roubou tempo” da matemática.

Associações como essa poderiam ser feitas em escala infinita.

Por exemplo, poderíamos afirmar que dentre essas escolas analisadas as que aderiram aos convênios para transporte escolar de seus alunos não lograram melhora em matemática, pois no mesmo período, a melhoria no quesito transporte resultou na queda de desempenho matemático por parte dos alunos.

É compreensível que entusiastas da escola sem partido, de uma candidatura que se baseia no elogio da ditadura e na distribuição incessante de argumentos violentos e preconceituosos, se apresentem com estudos (sic) com tamanha inconsistência.

É incompreensível que nossa sociedade assista à escalada desses argumentos sem se dar conta do abismo para o qual caminhamos.

Não se trata de vincular simplesmente essas ideias ao potencial eleitoral do candidato escolhido pelo analista. Pois se assim fosse, o insucesso na eleição por suposto resolveria a questão.

A questão aterradora se apresenta na constante e crescente legitimação desses pressupostos cuja força e enraizamento não dependem de vitórias em eleições majoritárias, mesmo porque têm seguro e pujante crescimento em eleições proporcionais.

Os autores ignoram inclusive debates sobre currículo e educação que há mais de 40 anos indicam que o adensamento analítico e reflexivo não é simplesmente parte complementar, mas sim peça fundamental para que o desempenho discente, inclusive no âmbito das chamadas ciências exatas, cresça e se consolide.

A matéria volta a se valer do surrado conceito de capital humano para lamentar os prejuízos que as humanidades estariam acarretando ao desenvolvimento do país.

O argumento deve ser rechaçado não somente por sua impressionante inconsistência, mas principalmente por sua consistente vinculação com um plano de violência que no transcorrer do século 20 alimentou a barbárie em sua versão mais crua e desumanizadora.

Um dos autores da pesquisa (sic) distribui vídeos explicando que em sua opinião o nazismo foi um movimento de esquerda!

Não, não é risível; é perigosíssimo!

Quanto mais oco, vazio e inconsistente mais palatável.

Circulou não em um panfleto de distribuição amadora; circulou no maior jornal do país, como se fosse uma opinião científica sobre um fato qualquer.

É um insulto. Atacar com tanta leviandade as humanidades e desprezar a humanidade. E é exatamente isso o que está em curso.

 

 

* Diretor do Cursinho da Poli e presidente da Fundação PoliSaber