O ministro Marco Aurélio Mello, relator do inquérito da Siemens no STF (Supremo Tribunal Federal) disse nesta segunda-feira (3) que deve proferir nesta semana algumas decisões no processo relativas ao compartilhamento de provas e ao sigilo dos autos.

De acordo com ele, somente informações que ferem a privacidade dos investigados devem ser mantidas em segredo. “O sigilo eu vou preservar no que a lei impõe, agora, no mais, não. Vamos abrir inclusive os nomes dos envolvidos”, disse Mello durante sessão solene no Supremo.

Em julho de 2013, a Folha revelou que a multinacional Siemens delatou a autoridades antitruste a existência de um cartel em licitações para obras e serviços de manutenção do Metrô de São Paulo e da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos).

Marco Aurélio também explicou que irá analisar um pedido feito pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para que provas dos autos sejam compartilhadas com uma comissão de sindicância que apura a atuação do procurador Rodrigo de Grandis, do Ministério Público Federal em São Paulo, suspeito de ter atrasado as investigações.

Em 2008, o Ministério Público da Suíça informou às autoridades brasileiras que havia indícios de que a multinacional francesa Alstom pagou propina a funcionários do governo do Estado de São Paulo para obter contratos nas áreas de energia e transporte. Em fevereiro de 2011, os suíços pediram ao Ministério Público Federal brasileiro que interrogasse quatro suspeitos do caso, analisasse sua movimentação financeira no Brasil e fizesse buscas na casa de um ex-diretor da CPTM, João Roberto Zaniboni.

Segundo o procurador Rodrigo de Grandis, responsável pelas investigações sobre a Alstom no Brasil, o pedido da Suíça foi arquivado numa pasta errada e isso só foi descoberto quase três anos depois, quando as autoridades brasileiras começaram a cobrar explicações sobre os pedidos. Grandis está sendo investigado por duas corregedorias por ter engavetado um pedido de cooperação da Justiça suíça no caso Alstom. Apesar disso, Grandis reassumiu o caso.

“O procurador preconizou que eu abra vista das peças a uma comissão de sindicância instaurada lá na Procuradoria de São Paulo para apurar possível desvio de conduta do procurador da República que atua no caso. Eu vou verificar a problemática do compartilhamento da prova”, disse Mello.

O ministro ainda voltou a dizer que irá desmembrar a investigação, mantendo no STF somente as autoridades com prerrogativa de foro, como deputados e senadores. O restante será enviado à Justiça de primeira instância.

Segundo Marco Aurélio, a medida será adotada para “evitar o que houve na AP 470 [processo do mensalão]”, quando todos os envolvidos foram julgados pelo STF. As declarações foram dadas por Marco Aurélio logo após a abertura do ano judiciário no STF.

Na sessão solene, o presidente da corte, Joaquim Barbosa, disse que em 2013 o tribunal julgou 45 processos com repercussão geral reconhecida. Esses processos refletem em decisões de cortes inferiores, uma vez que os casos com repercussão ficam suspensos nos tribunais até que o STF defina um entendimento sobre o tema. De acordo com Barbosa, as decisões do Supremo viabilizaram que os tribunais julgassem 116 mil processos que estavam sobrestados.

CARTEL

Em julho de 2013, a Folha revelou que a multinacional Siemens delatou a autoridades antitruste a existência de um cartel em licitações para obras e serviços de manutenção do Metrô de São Paulo e da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos).

Documentos da Siemens entregues ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) mostravam que o governo de São Paulo, controlado pelo PSDB, teria dado aval ao conluio. A empresa fez acordo que lhe garantirá imunidade se as denúncias forem comprovadas. Além da Siemens, o cartel envolveria Alstom, Bombardier, CAF e Mitsui.

Em São Paulo, o esquema teria começado em 1998, no governo Mário Covas, e ido até 2008, passando pelos também tucanos Geraldo Alckmin e José Serra. Apesar de a Siemens negar pagamento de propinas a políticos, um ex-diretor da empresa disse nomes à Polícia Federal. A Justiça Federal enviou a investigação ao STF.

Ele diz ter ouvido de um diretor da CPTM que receberam propina Edson Aparecido (PSDB), chefe da Casa Civil de Alckmin, Rodrigo Garcia (DEM), secretário de Desenvolvimento Econômico, o deputado federal Arnaldo Jardim (PPS-SP) e o deputado estadual Campos Machado (PTB). Todos negam.

O inquérito sobre a Siemens é desdobramento de outro, de 2008, sobre o pagamento de propina pela Alstom a políticos do PSDB e servidores de São Paulo. Entre os indiciados está o vereador Andrea Matarazzo (PSDB). Ele nega a prática de crime.

O caso foi reaberto após a Justiça da Suíça ficar três anos sem resposta do procurador Rodrigo de Grandis, que cuidava do assunto no Ministério Público Federal. Ele diz ter arquivado o pedido em uma pasta errada.