O carnaval chegou. E com ele a velha cartilha da festa pagã, que inclui os tradicionais desfiles carnavalescos, blocos espalhados por todo o Brasil, fantasias, serpentinas, pierrots, colombinas e afins. Essas são manifestações culturais enraizadas em nossa formação e adquiriram um status imutável no Brasil.

Por aqui, o carnaval sempre teve o papel de maior produto de exportação. Suas mulatas sambando sempre povoaram o imaginário de pessoas ao redor do mundo, ao ponto de muitos “gringos” pensarem que o Brasil funciona somente durante os 5 dias de carnaval. Diante dessa força nada mais natural, do que o carnaval ser despejado goela abaixo da população brasileira, que fica praticamente sem direito de cuspir para os lados.

Mas uma transformação recente neste panorama vem desagradando os mais puristas e chamando a atenção de organizadores e do público em geral: o carnaval brasileiro está mais eletrônico do que nunca. Ao que parece muitas pessoas, principalmente das classes A e B, estão optando pelo 4×4 ao invés dos barulhos das cuícas e tamborins.

A maior prova disso são os inúmeros eventos e DJs de música eletrônica que desembarcam por aqui nessa próxima semana e seguem firme até a quarta-feira de cinzas. São festas em cidades como Salvador, Rio de Janeiro e Recife, que nada lembram a folia de carnaval e são uma alternativa para quem nunca foi muito fã de marchinhas e enredos.

Invadindo a tradição

Pelo segundo ano consecutivo a cidade do Rio de Janeiro recebe o Rio Music Conference. Idealizado por Bruno Mello, esse evento teve peito não só de colocar a eletrônica em evidencia em pleno carnaval carioca, mas também de dar um caráter mais didático em uma época onde a maioria das pessoas só pensa em diversão. O Rio Music Conference começa nessa quarta-feira ensinando, propagando conhecimento, realizando palestras e workshops sobre a música eletrônica. Atraindo pessoas de todo o mundo, ele tira o carnaval de foco e leva o público para festas eletrônicas que começam na sexta-feira, todas com grandes atrações internacionais como Armin Van Buuren, Loco Dice, Luciano, Erick Morillo, entre outros.

Muito procurada na época de carnaval, Salvador, famosa pelo axé, trios-elétricos e abadas, aos poucos começa a se render lentamente à eletrônica. A maior prova disso é o Bloco Skol Folia, que na terça-feira dia 16, leva para o meio do carnaval soteropolitano um bloco eletrônico com os DJs Ferry Corsten e Laidback Luke. Quem estiver disposto a gastar um pouco mais(tendo em vista que já é bem caro passar o carnaval em Salvador) pode optar pelo Camarote Salvador 2010, que montou um verdadeiro time de atrações internacionais: Bob Sinclair, Deadmau5 , Kurd Maverick e Cid Lergan. Sem contar nosso querido Gui Boratto. Além disso, quase todos os artistas que se apresentam no carnaval (Ivete Sangalo, Asa de Águia, Daniela Mercury, Chiclete com Banana) adotaram DJs para fazer o warm-up antes dos blocos passarem.

Recife, famosa pelo frevo e o bloco Galo da madrugada, o maior do Brasil, também vem apostando na variedade musical, ainda que de forma mais tímida. O mais interessante deles é o Tenda Eletrônica 2010, um evento gratuito patrocinado pela prefeitura da cidade (veja só) que vai levar para o Cais da Alfândega dos dias 13 à 16 de fevereiro, atrações de diversos gêneros musicais. Nomes eletrônicos como o chileno Matias Aguayo, o inglês Deeder Zaman, além dos brasileiros Zegon e Nego Moçambique embalam esse evento que contará também com exibições de moda.

Lugares onde a eletrônica já são a regra

Se existe um lugar onde a música eletrônica está sempre presente, seja no carnaval ou réveillon é o litoral de Santa Catarina. As cidades de Balneário Comburiu, Itajaí e Florianópolis, que há algum tempo vem sendo chamadas de Ibiza Brasileira, recebem nesse ano, durante o carnaval, a mais significativa programação eletrônica de todo o Brasil. A isso se deve às atrações internacionais convidadas (Steve Angello, Hernan Cattaneo, Sultan, Ned Shepard, Kaskade, Sharam, Solomun, Nicky Curly, Ferry Cursten, Erick Morillo) pelos super clubs, como o Warung, Blue Coast, P12 e Pacha. A Green Valley vai além e realiza em suas dependências o SOME FESTIVAL, um super evento, dia 15 de fevereiro, feito em parceria com núcleo paulista XXXperience e o curitibano Tribaltech e que promete ser um divisor de águas na forma de realizar festas indoors de grande porte. No cardápio de atrações nomes como Loco Dice, Sander Van Doorn, Jerome Isma Ae, Bob Sinclair, Boris Brejcha e Ticon.

Em nenhum outro ponto do Brasil, a música eletrônica está mais enraizada do que em São Paulo. Mas como a cidade sofre um verdadeiro êxodo durante o carnaval, esse traço é levado para onde quer que o paulistano vá, principalmente no litoral. Maresias, Cambori, Guarujá, Ubatuba, Ilha Bela, todos possuem clubs ou festas com a música eletrônica ditando ritmo.
Arrisco dizer que durante o carnaval em boates do litoral paulista, o número de festas eletrônicas já passou às aquelas dedicadas aos ritmos mais tradicionais. O destaque fica a cargo da XXXperience, dia 15, no club Sirena. Dividindo as atrações entre as duas pistas do club, a XXX faz uma edição indoor e leva seu tradicional psy/prog trance para a pistinha, com nomes como Krome Angels e Ticon. Já na pista maior, novamente Loco Dice, Sander Van Doorn e Seth Troxler dão o tom. Além disso, para quem ficar em São Paulo, diversos clubs prepararam uma programação de carnaval, para quem quer fugir do marasmo que a cidade se encontra durante feriado.

4×4 finca raiz

No Brasil, mesmo estando na estrada por cerca de 20 anos, é impressionante como a música eletrônica sempre é apontada como a próxima tendência, nunca ocupando o lugar da atual. Mas diante do seu alcance e da forma como ela fincou alicerces, tudo indica que a e-music é a mais significativa tendência dentro do carnaval nacional em anos. E mais, veio redentora para ocupar uma lacuna antiga: a de grande alternativa para aqueles que estão cansado dos foliões e suas serpentinas.