Rodrigo Capote/UOL
A Cine Pizza, que une cinema ao tradicional prato italiano, hoje depende das massas para não fechar
Elas já dominaram o mundo e hoje estão ameaçadas de extinção. Em crise há pelo menos seis anos, as locadoras de filmes lutam para sobreviver. Global, a crise atingiu com força até a ex-gigante rede Blockbuster, que no início deste mês fechou sua última loja nos Estados Unidos. Para enfrentar o momento, o pior em três décadas, empresários e lojistas da capital paulista vêm adotando uma estratégia comum: diversificar produtos e serviços oferecidos.
O desafio é o mesmo para todos. Concorrer com a internet e seu farto cardápio de downloads (legais ou piratas) e serviços de streaming como o Netflix, além do acesso cada vez mais facilitado da rival TV por assinatura.
Uma das mais tradicionais locadorasde São Paulo, a Space Video, que completou 30 anos em 2013, acaba de mudar o nome para Space Loja. A ideia é tirar o foco do universo cinematográfico.
“Acho que o serviço de locação vai ficar tão pequeno que não sei se vai continuar valendo a pena viver disso”, vislumbra Carlos Mota, dono da Space Loja. “Já não estamos mais encarando como uma fase, como há alguns anos, mas sim como uma crise”, disse ao UOL o auxiliar administrativo Léo Mota, filho de Carlos.
A projeção pessimista é perceptível logo ao entrar na loja. Os filmes expostos para locação ocupam pouco mais da metade do espaço. O restante é preenchido com itens de alimentação e brinquedos à venda, que correspondem a 35% do faturamento da loja.
Se em 2005 mais de 3.500 filmes eram locados em um final de semana considerado bom para o negócio, hoje esse número chega a pouco mais de mil. Segundo lojistas, o segmento viveu seu auge na metade dos anos 2000, após a consolidação do DVD. Para especialistas em mercado, dificilmente ele resistirá aos próximos cinco anos.
De acordo com o sindicato paulista de videolocadoras, existiam 1.830 lojas no Estado em 2011, menos da metade das que havia em 2006. A projeção é que esse número caia ainda 30% na próxima pesquisa, que está sendo feita este ano.
“Estamos passando por um momento complicado, mas não acredito que o mercado acabe. Apenas ficará menor. As lojas de CDs não acabaram. Vivemos uma reestruturação com a expansão do mercado de TVs pagas e locações on line, afirmou o presidente do sindicato, Luciano Damiani.
Ainda mais pessimistas que seu representante, os lojistas fazem de tudo para garantir sobrevida: de promoções cada vez mais recorrentes, passando por novos produtos e serviços e até mesmo a produção de eventos relacionados ao cinema. Tudo para fugir de uma ameaça que recai não apenas sobre as lojas de bairro de pequeno porte.
Corredor vazio da 2001, no Jardins; Para tentar driblar crise, rede inaugurou sistema delivery
“Está havendo uma mudança no comportamento dos consumidores”, disse a empresária Sonia Abreu, dona da 2001, que possui seis lojas na cidade de São Paulo e acervo de mais de 20 mil títulos. De olho no consumidor que baixa filmes na internet e assina serviços como o Netflix, a rede aderiu em outubro ao sistema delivery. “Hoje exige-se muito mais trabalho e criatividade para convencer uma pessoa a economizar suas horas nas redes sociais para assistir a um filme ou ler um livro”,
A criatividade passa até por uma combinação curiosa: unindo pizza e cinema, a proposta da pioneira Cine Pizza, fundada em 1997, foi uma forma de driblar a primeira grande crise do setor, que na época viu a antes incipiente TV a cabo engolir parte de sua clientela.
Hoje, com a internet, o cenário se repete, mas com ainda mais força. Cerca de 70% do faturamento da loja sediada no bairro Perdizes vem das massas. Para levar um filme de graça, basta pedir uma pizza no balcão.
“A realidade é muito pior do que já foi. Não sei se as lojas físicas serão extintas, mas o prognóstico é pessimista. Se dá para assinar um serviço em casa ou mesmo baixar até de graça o filme, por que ir à locadora?”, questiona Adriana Aguiar, dona da Cine Pizza.
Vantagens
Embora nadem contra uma corrente aparentemente irreversível, ainda há quem resista à praticidade da web e da TV por assinatura para assistir aos seus filmes.
É o caso da psicóloga Flávia Serson, 49, que jamais aderiu aos serviços de streaming nem perdeu o hábito de frequentar locadoras. E os motivos emocionais vencem a razão. “Gosto do atendimento mais pessoal. Eles recomendam o filme, já sabem um pouco do meu gosto. Para mim, facilita muito para gostar do filme e não desperdiçar meu dinheiro”, disse ela, afirmando que sentirá muita falta caso um dia as lojas desapareçam.
As questões relacionadas ao bolso também levaram a dona de casa Cida Badlone, 45, a não abandonar suas idas às locadoras. Mãe de dois filhos loucos por cinema, ela disse que o grande atrativo ainda é o preço. Basta pesquisar e escolher bem a locadora. “A gente já aluga filmes pela TV a cabo, e lá o preço é R$ 9,90. Aqui na locadora o DVD é R$ 5. Então ainda vale a pena sair de casa”.
“Já assisti filme pelo Netflix na casa de amigas, mas, como minha internet não é tão rápida, o filme acaba travando. Gosto do ritual de escolher pessoalmente os clássicos e, depois, sentar no sofá da minha casa e relaxar”, disse a assessora de imprensa Renata Peireita, 26. Os lançamentos e a qualidade de som e imagem, nem sempre tão perfeitos, também são motivos para alugar à moda antiga. “Às vezes quero ver os filmes do Oscar, e na locadora ainda é o melhor lugar para encontrá-los.”