O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), negou nesta sexta-feira (17) que a demissão de Benedito Dantas Chiaradia tenha relação com o depoimento prestado por ele à Polícia Federal em que cita pagamento de propina do cartel que fraudou licitações de trens em São Paulo de 1998 a 2008 a agentes públicos.

Em seu depoimento em novembro do ano passado, Chiaradia afirmou ter ouvido conversas sobre o pagamento de propina a agentes públicos e a funcionários da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) e do Metrô. No dia 20 de dezembro, Chiaradia foi demitido de um cargo de direção do DAEE (Departamento de Águas e Energia Elétrica).

“Não, não, não há nenhuma relação. Era um cargo de confiança do próprio DAEE e ele saiu. Nenhuma relação. Eu nem tinha conhecimento de que ele estava no DAEE. Não tem nenhuma razão específica”, disse o governador após anunciar a ampliação do investimento no convênio com APAEs e outras entidades que atendem a alunos com deficiência em todo o Estado.

Na edição desta sexta-feira, o jornal “O Estado de S. Paulo” revelou que, em um depoimento de 14 de novembro, Chiaradia –que já trabalhou na CPTM– disse à PF ter ouvido conversas indicando que o lobista Arthur Teixeira, que prestava consultoria às empresas processadas agora pelo governo paulista por formação de cartel, viabilizava o pagamento de propina ao hoje conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, Robson Marinho. Nos anos 90, Marinho foi chefe da Casa Civil do governador Mário Covas (PSDB). Marinho tem negado sistematicamente qualquer envolvimento com o cartel.

INDENIZAÇÃO

O governo de Geraldo Alckmin (PSDB) não atendeu à decisão judicial que determinou a indicação dos prejuízos causados pelo cartel que fraudou licitações de trens em São Paulo de 1998 a 2008 e colocou em risco o processo em que pede indenização às empresas acusadas de envolvimento nos conluios.

A administração estadual argumenta que não tem “elementos suficientes” para determinar os danos aos cofres públicos e que para isso será necessária “complexa perícia que terá por escopo comparar os preços de mercado com os contratados”.

Na petição inicial do processo de indenização, protocolada em agosto, a PGE já havia afirmado que não seria possível estimar os prejuízos causados pelo cartel e indicou R$ 50 mil como valor da causa, apenas para o cálculo de taxas judiciais. Porém, o Ministério Público, que atua no caso como fiscal da lei, apresentou à Justiça entendimento diferente.

A Promotoria argumentou que o Código de Processo Civil determina que em casos como o do cartel deve ser indicado como valor da causa o total dos contratos fraudados, ante a impossibilidade de fixação dos danos. A juíza Celina Toyoshima atendeu ao requerimento do Ministério Público e determinou que a PGE fizesse uma emenda à petição inicial para acrescentar a estimativa.

O governo de São Paulo diz que a decisão de deixar a definição dos prejuízos causados pelo cartel de trens para o final da causa está amparada em decisões de tribunais. As empresas incluídas na ação de indenização negam a formação de cartel em licitações entre 1998 e 2008.

INSTITUTO ETHOS

Na quarta-feira (15), o Instituto Ethos divulgou sua saída do grupo de entidades da sociedade civil que acompanham as investigações da CGA (Corregedoria-Geral da Administração) sobre a formação de cartel em licitações de trens no Estado de São Paulo.

Segundo o vice-presidente do Ethos, Paulo Itacarambi, o instituto entende que o grupo já deu o suporte necessário e não tem mais com o que contribuir. Itacarambi avaliou que, apesar da discussão ser “muito aberta com os membros do grupo”, falta empenho dos demais órgãos do governo estadual na investigação.

O grupo de acompanhamento do qual o Ethos fazia parte foi criado em agosto de 2013. Foram realizadas dez reuniões no ano passado, cujas atas foram divulgadas no site da CGA.

O vice-presidente da Ethos afirmou que a saída do instituto não se deve a qualquer tipo de conflito com o grupo ou com a CGA e o governo do Estado. “Nós colocamos algumas demandas à CGA, que têm sido cumpridas. O nosso trabalho chegou a um limite”, afirmou.

Entre as demandas, estava o pedido de que todas as informações apresentadas nas reuniões do grupo fossem publicadas no site da corregedoria e que outros contratos, além daqueles feitos com a Companhia Paulistana de Trens Metropolitanos (CPTM), fossem investigados. Segundo Itacarambi, a CGA afirmou que novas investigações deverão ser feitas após a conclusão do inquérito sobre a suspeita de cartel.

Outro membro do grupo, a ONG Transparência Brasil, também deve deixar as reuniões da CGA após a conclusão de um relatório final sobre o trabalho de acompanhamento.

Questionado sobre a saída do Instituto Ethos do grupo da CGA em entrevista coletiva na quinta-feira (16), Alckmin afirmou que o grupo deu grande colaboração e disse que o governo está comprometido com as investigações.

CASO

No dia 14 de julho de 2013, a Folha revelou que a multinacional alemã Siemens delatou ao governo brasileiro a existência de conluio em licitações de alguns trechos dos metrôs de São Paulo e do Distrito Federal. O objetivo era direcionar a concorrência e assegurar preços mais altos dos serviços prestados. O caso ainda está em apuração, e envolve também outras multinacionais como Bombardier, Mitsui, CAF e Alstom.

Em depoimento ao Ministério Público, o lobista Arthur Teixeira disse que o ex-diretor da Siemens Everton Rheinheimer, um dos delatores do cartel que atuou no Metrô e na CPTM, dava sinais de que queria receber alguma “participação” em negócios da multinacional com as estatais paulistas de trens.

O delator “insinuava interesse em receber algum valor”, segundo ele. Teixeira está sob investigação da Polícia Federal e do Ministério Público sob suspeita de ter intermediado o repasse de propina a políticos do PSDB e servidores estaduais em projetos de interesse da Siemens e outras empresas do cartel.

Ele foi contratado por um consórcio do qual a Siemens fazia parte, o Sistrem, que é acusado pela própria multinacional de ter feito um conluio para ganhar a licitação da CPTM para a construção da atual linha 5 do Metrô.

O consórcio era formado por Siemens, Alstom, CAF e DaimlerChrysler, que subcontrataram a Mitsui e a TTrans. A subcontratação foi combinada, segundo a Siemens. O lobista diz que não participou da formação do consórcio, mas assessorou e gerenciou parte do contrato.