A 64ª edição da Berlinale quer provocar seus espectadores. Além de exibir a versão sem cortes de “Ninfomaníaca – Parte 1” e desfilar o sex-appeal de George Clooney pelo tapete vermelho, a partir de quinta-feira (6) o Festival de Berlim vai levar aos 500 mil espectadores discussões apimentadas e documentários que revelam análises criativas e diversificadas sobre sexo.
Aproveitando o espaço aberto que já existe na mostra Panorama para levantar discussões, serão aprofundados temas como o dever político da comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) de se manifestar em tempos de intolerância e o preconceito nas relações entre transgêneros e transsexuais. Os temas procuram ir além do beijo gay, um amadurecimento da questão e uma tentativa de retratar o que existe depois do preconceito.
Abrindo a programação da mostra, o documentário “The Dog” reconstrói a trajetória do bissexual John Wojtowicz, famoso por roubar um banco no Brooklyn, em Nova York, para financiar a cirurgia de troca de sexo do seu amante em 1972. Ainda no universo masculino, entre suor e testosterona no futebol, “Land of Storm” conta a história de Szabolcs, um jogador húngaro que sai do armário e tenta fugir da mídia buscando tranquilidade na fazenda do avô. O filme trouxe a tona o caso do alemão Thomas Hitzlsperger, ex-jogador do Bayern de Munique, que recentemente declarou ser gay.
Dirigido pelos alemães Ulrike Zimmermann e Claudia Richarz, o documentário “Vulva 3.0” mostra como o órgão feminino é visto no século 21 em meio a tabus relacionados à educação sexual e ao mercado de cirurgias plásticas. Em uma experimentação com sete diretores, “Fucking Different XXY” reúne transsexuais e transgêneros compartilhando suas impressões cinematográficas variadas e explícitas sobre a sexualidade e o corpo humano.
Ao mesmo tempo que traz novos temas para debate, a programação sexual divide espaço com romances. Na ficção, o destaque fica com as descobertas juvenis e o bullying sofrido pelo casal de garotos sul-coreanos em “Night Fight”; e o triângulo amoroso adolescente em “Hoje Eu Quero Voltar Sozinho”, do brasileiro Daniel Ribeiro. A cereja no bolo do arco-íris é a apresentação da trajetória bem sucedida do estilista francês Yves Saint Laurent na moda em cinebiografia homônima interpretada por Piérre Niney.
Para o curador da mostra, Wieland Speck, os filmes são um retrato espontâneo da produção relacionada ao assunto, que tem crescido nos últimos anos. “É um assunto delicado, a sexualidade é usada para classificar as pessoas, para mantê-las dentro de um determinado intervalo de comportamento. E a homossexualidade é apenas uma vítima da atitude geral em relação à sexualidade e seu uso indevido. É sempre um tópico para discutir. E, para alguns, ainda é uma razão para fazer um filme.”
Outras curiosidades do Festival de Berlim:
– Musicais de Nick Cave e Belle & Sebastian
Entre os filmes musicais que serão exibidos no festival estão dois longas que passaram pela última edição de Sundance, em janeiro: o britânico “20,000 Days on Earth”, documentário dramático sobre a vida Nick Cave; e “God Help The Girl”, filme inspirado pelo álbum homônimo da dupla Belle & Sebastian, estreia na direção do músico Stuart Murdoch.
– A China é o novo indie
Os filmes chineses são a promessa da vez. Os curadores do festival adotaram os jovens cineastas orientais como revolucionários em suas formas de contar histórias. Entre os participantes das mostras estão “Black Coat, Thin Ice”, “The Midnight After” e “That Demon WithIn”.
Uma das palestras mais aguardadas pelos estudantes do Talent Campus é a desengonçada combinação de Greta Gerwig, a bailarina espevitada de “Frances Ha”, com Michel Gondry, de “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”, com dicas para tirar o roteiro do papel e começar seu próprio filme.
– Diferentes fases históricas de Berlim
Alguns dos filmes mais importantes da mostra competitiva foram filmados na cidade e em estúdios próximos a capital alemã. “Caçadores de Obras-Primas” e “Beauty and The Beast” utilizaram as florestas e estúdios da cidade de Brandenburgo: o primeiro filme para relatar parte da Segunda Guerra Mundial, e o segundo para remontar a vegetação que inspirou os contos de fadas alemães dos Irmãos Grimm. “Grand Budapest Hotel” teve boa parte de seu hotel filmado na cidade de Görlitzer, que ainda preserva uma imagem pré-guerra, com prédios clássicos. Já o brasileiro “Praia do Futuro”, com Wagner Moura, foi gravado mostrando um pouco de como a cidade é hoje durante as gravações em 2012.