Sem qualquer motivo para festa, haja vista o momento por que passa o país, o brasileiro relembra um dos momentos mais decisivos de sua vida. A pedido da coluna, João Francisco Tidei Lima, historiador, escritor e professor aposentado da Unesp de Assis tece algumas considerações sobre a data. Vale a pena conferir a mensagem que ele nos passa, inclusive uma oportuna comparação com os Estados Unidos.

Perto do bicentenário
Ele começa sua análise desta maneira: Amanhã, feriado nacional, o país comemora 193 anos, desde a chamada independência em 1822. Mais sete anos e serão dois séculos, tempo mais do que suficiente para a solução dos problemas estruturais mostrados pelo dia-a-dia da nossa triste realidade. Verdadeiro subcontinente, o Brasil, desde a chamada independência, caminhou sem grandes rupturas. Herdou a monarquia portuguesa, à testa o filho do antigo monarca, depois o neto…

Demorou demais
Regime de trabalho dominante, a escravidão. Enquanto, por exemplo, nos Estados Unidos essa herança colonial foi combatida e derrubada por uma guerra civil
(1861-1865), entre nós ela seguiu inabalada, até se extinguir em 1888, projetando o Brasil como o último país da América a abolir a escravidão africana.

Na base do dinheiro
Necessária a comparação com os Estados Unidos, também um subcontinente. Lá, sua Lei de Terras, de 1862, doava terra a todos os que desejassem nela se instalar, na região do velho oeste. Por aqui, a nossa Lei de Terras, de 1850 dificultava a obtenção da terra pelo trabalhador livre. As nossas elites, já proprietárias de grandes fazendas, determinavam que, a partir de 1850, a única maneira de adquirir terra, seria pela compra.

O contraste nos números
Por isso, nos Estados Unidos, massas de imigrantes engrossaram a marcha para oeste. Isso estimulou o desenvolvimento ferroviário. À altura de 1860, o país tinha 50 mil quilômetros de trilhos. O Brasil não tinha mais do que 100 quilômetros. Em 1869, os Estados Unidos inauguraram a primeira ferrovia transcontinental da América, ligando o Atlântico ao Pacífico. No fim do século XIX, já tinham mais de 130 mil quilômetros de trilhos. Hoje, têm o dobro, ligando os oceanos em várias latitudes.

Deu no que deu
Entre nós, já há várias décadas, o Brasil vive congestionado nas avenidas e nas estradas. por caminhões, ônibus, automóveis e motos, recordista mundial de acidentes com vítimas fatais. A rigor, não tem mais do que 10 mil quilômetros de trilhos ferroviários. Já teve 37 mil, 50 anos atrás. A cidade de Bauru, por exemplo, decolou graças à ferrovia. Foi o maior entroncamento ferroviário do interior da América do Sul. Hoje, é uma vitrine de sucata ferroviária, conclui o historiador.

Apesar de tudo…
Mesmo sabendo que na volta a seus lares, encontrarão os problemas de sempre na combalida malha rodoviária, os brasileiros devem comemorar a Independência. E, por algumas horas, imaginarem que, num futuro não muito remoto, o país viverá sem ‘mensalões’ e operações lava-jatos. E que palavras como ‘propina’ e ‘desfalques’ sejam extirpadas de nosso vocabulário.