A reforma do RGPS (Regime Geral da Previdência Social) tornou-se uma necessidade fundamental para a sustentabilidade das contas públicas brasileira. A despesacom benefícios previdenciários já equivale a mais de 40% dos gastos do governo federal, com tendência de crescimento. Este ano a projeção é de um montante de dispêndio superior a R$ 480 bilhões (7,6% do PIB) e já em 2026 deve ultrapassar R$ 1 trilhão (quase 8,5% do PIB). Mudanças na estrutura demográfica do país aceleram a concessão de benefícios e o número de pessoas ativas que contribuem para o INSS é cada vez menor. A título de exemplo, entre 2002 e 2015 o número de beneficiários do regime geral saltou de 18,9 milhões para 28,3 milhões.
A questão demográfica é um fator de grande relevância na demanda por reformas nas regras previdenciárias brasileira. Entre 1980 e 2015 a taxa de fecundidade no país caiu 57,7%, passando de 4,1 filhos para 1,7 filho por nascidos vivos por mulher, o que significa menor crescimento da população no futuro. No mesmo período a esperança de vida ao nascer saltou de 62,6 anos para 75,4 anos, devendo ultrapassar os 80 anos em 2042. Resumindo, o país terá cada vez mais pessoas vivendo mais frente a um contingente cada vez menor de indivíduos contribuindo para a Previdência para manter esses inativos.
Uma informação que evidencia a deterioração previdenciária brasileira refere-se à decrescente relação entre contribuintes e beneficiários do RGPS (Regime Geral da Previdência Social). Em 1980 ela era de 3,2 e em 2020 a expectativa é de que seja ligeiramente acima de 1. Esse aspecto é fundamental para o atual desequilíbrio das finanças da Previdência no país, cuja tendência é de aprofundamento. A deterioração orçamentária vem ocorrendo de modo acelerado. Em 1997 o saldo positivo de R$ 3,3 bilhões (0,35% do PIB) passou a ser negativo ano após ano e em 2015 atingiu R$ 85,8 bilhões (1,45% do PIB). De acordo com a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2016 o déficit estimado para 2040 é de 3,52% do PIB.
Cumpre ressaltar que um aspecto determinante para o desequilíbrio financeiro da Previdência brasileira refere-se à série de benefícios criados pela Constituição de 1988. Em que pese o mérito social das mudanças ocorridas, sobretudo no âmbito das aposentadorias rurais, o problema é que a ampliação de direitos fez crescer fortemente os gastos sem que houvesse ações no sentido de viabilizar um equilíbrio financeiro estruturado do sistema. Assim, foi inevitável a expansão dos déficits orçamentários, o que, diga-se de passagem, acabou comprometendo os recursos destinados à saúde pública, que tinha parte de suas atividades custeada pelos repasses do saldo previdenciário.
Há alguns anos a reforma da Previdência vem sendo postergada. Trata-se de uma demanda que envolve medidas impopulares, mas necessárias para o equilíbrio das contas públicas. Não fazê-la implica necessariamente na redução de recursos em outras áreas, o que compromete serviços já deficientes como a saúde e a educação públicas, ou no aumento da já pesada carga tributária do país.
Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA), professor titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas.