Em sua primeira tentativa de selecionar estudantes de graduação por meio do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), em 2016, a Universidade de São Paulo (USP) teve um êxito de 54,7%. Das 1.489 vagas oferecidas pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu) no ano passado, só 814 acabaram preenchidas por candidatos do Enem. As demais 675 foram remanejadas e preenchidas nas últimas chamadas do vestibular da Fuvest.
Neste domingo (22) e segunda-feira (23), o G1 publica três reportagens especiais sobre a decisão que abriu uma alternativa inédita de acesso à graduação da USP. Veja alguns destaques:
- Entre 2016 e 2017, o número de vagas da USP destinadas ao Sisu subiu 57%
- No mesmo período, a quantidade de vagas reservadas para a cota racial cresceu 376%
- Um dos primeiros estudantes da USP aprovados pela cota racial relata sua trajetória
- Em 2016, quase metade das vagas da USP no Sisu ficaram vazias, e foram preenchidas pelos candidatos da Fuvest
- A Pró-Reitoria de Graduação e professores de diversas unidades explicam os motivos por trás do aumento de vagas no Sisu e os planos para aumentar o preenchimento delas
Ainda que quase metade das vagas oferecidas no Sisu não tenham sido preenchidas pelo público-alvo original, o professor Antonio Carlos Hernandes, pró-reitor de Gradução da USP, afirmou ao G1 que a experiência foi considerada bem sucedida e levou ao incentivo de que as unidades aumentem sua participação no sistema do Ministério da Educação.
De acordo com ele, a modalidade do Sisu em que houve a maior porcentagem de vagas “sobrando”, seja por falta de procura ou porque não houve candidatos com a nota mínima exigida pela universidade, foi a de ampla concorrência, onde qualquer estudante que tivesse feito o Enem 2015 podia disputar vagas. Das 328 vagas oferecidas a este grupo, 165, ou 50,3%, ficaram vazias após quatro chamadas da USP no Sisu, e acabaram indo para vestibulandos da Fuvest.
Na modalidade que reservou vagas para estudantes oriundos da rede pública, foram oferecidas 1.038 vagas, e 471 acabaram sem preenchimento, o que representa 45,4% do total. Já a modalidade de vagas para estudantes pretos, pardos e indígenas foi a mais bem sucedida da USP no Sisu: das 123 vagas oferecidas, só 39, ou 31,7%, acabaram vazias ao fim do processo, e foram oferecidas a candidatos na lista de espera da Fuvest.
“A avaliação é muito positiva, o que levou a Pró-Reitoria de Graduação a incentivar o ingresso de mais unidades no processo de 2017 e o aumento no número de vagas destinadas exclusivamente ao Sisu”, explicou Hernandes. “Nesse processo seletivo [de 2017], somente três unidades ficaram de fora do Sisu (Faculdade de Medicina, Instituto de Física, Escola de Engenharia de São Carlos), das 42 unidades de ensino da USP. Espera-se o ingresso de todas as unidades no próximo processo de ingresso.”
As inscrições para o Sisu começam na próxima terça-feira (24).
Ajuste no calendário e nas notas
Alguns fatores foram apontados pelo professor Marcos Neira, presidente da Comissão de Graduação da Faculdade de Educação (FE) da USP, como motivadores do baixo índice de preenchimento de vagas: o calendário do Sisu 2016 e o receio, por parte de participantes do Enem, de que seria impossível passar em uma das vagas da USP pelo sistema.
“Quando a gente faz uma mudança desse tipo, sempre leva um tempo para a sociedade entender. Os candidatos às vezes nem se arriscam tanto, porque aí talvez fiquem de fora. Os alunos do Sisu efetuaram a matrícula, mas alguns acabaram não confirmando e saindo porque foram aprovados em outros vestibulares. Por exemplo: eles concorreram em pedagogia no Sisu e em outra carreira pela Fuvest, ou por outra universidade. Fizeram a matrícula [na USP]. No primeiro dia do Sisu eles procuraram. Mas depois, a gente deu o prazo de 15 dias para a confirmação da matrícula, e eles não confirmaram”, disse ele.
O curso de pedagogia da FE, por exemplo, ofereceu 54 vagas pelo Sisu, mas só preencheu 34 delas pelo sistema. “Mas o que tinha sido decidido era que as vagas não-preenchidas iam para a Fuvest. No processo passado, as datas do Sisu foram diferentes da Fuvest nas datas de matrícula. Agora, já há congruência das datas para preencher todas as vagas”, explicou Neira.
“A avaliação é muito positiva, o que levou a Pró-Reitoria de Graduação a incentivar o ingresso de mais unidades no processo de 2017 e o aumento no número de vagas destinadas exclusivamente ao Sisu”
(Antonio Carlos Hernandes, pró-reitor de Gradução da USP)
Eduardo Ferriolli, presidente da Comissão de Graduação da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), afirma que 25 vagas em seis cursos foram oferecidas pelo Sisu, além de quatro vagas no curso de informática biomédica, oferecido em conjunto com a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto. No fim das quatro chamadas do sistema do MEC, 15 dessas 29 vagas foram preenchidas.
Ele explica que, no caso de sua unidade, uma das mudanças feitas para aumentar a taxa de preenchimento nesta edição foi reduzir as notas mínimas exigidas para a aprovação dos estudantes. “Decidimos manter a participação no Sisu inalterada porque consideramos a experiência do primeiro ano como preliminar. Alguns ajustes foram feitos, pela FMRP, nas notas de corte e pesos. A própria Universidade de São Paulo, com esta primeira experiência, implementou mudanças no processo para aumentar o aproveitamento das vagas. Dessa forma, decidimos manter inalterada a porcentagem de vagas total oferecidas (10%) e avaliar, após o próximo processo seletivo, o resultado dos ajustes que foram feitos pela FMRP e pela USP”, disse Ferriolli.
Nesta edição do Sisu, a pedido das universidades, o MEC flexibilizou as regras para o cálculo das notas do Enem. Nas edições anteriores, as instituições podiam definir o peso e as notas mínimas exigidas em cada prova do Enem na hora de calcular a nota final de cada estudante no Sisu e, então, selecionar os calouros para as vagas com base nessa pontuação. A partir de agora, a instituição poderá continuar seguindo esses critérios, mas também terá autonomia para definir uma média mínima nas provas para selecionar os candidatos. Será possível, inclusive, usar uma combinação dessas regras para que o Sisu defina os aprovados.
Combate à evasão
Com a inclusão de estudantes de outras partes do Brasil e oriundos da rede pública de ensino, surge também a preocupação com políticas de permanência dos aprovados na universidade.
Na FMRP, “dos alunos que confirmaram matrícula, dois participam de programas de apoio à permanência, um na forma de bolsa de estudos, auxílio livros, auxílio moradia emergencial e, posteriormente, vaga em moradia, além de auxílio alimentação; outro na forma de auxílio moradia e auxílio alimentação”, disse Ferriolli.
Na Escola de Artes e Ciências Humanas (Each), que tem 30% de suas vagas no Sisu desde o primeiro ano, a realidade do quadro discente é mais diversa. “Já tínhamos mais de 50% dos alunos de graduação oriundos de escolas públicas e diversos alunos de fora da cidade de São Paulo”, explicou Luciano Digiampietri, presidente da Comissão de Graduação. “De um modo geral, as necessidades dos alunos que ingressaram via Sisu foram as mesmas daqueles que ingressam via Fuvest. Obviamente estamos acompanhando a situação e às demandas de forma a tentar apoiar a todos os alunos da USP da melhor forma possível, independentemente da forma de ingresso.”
Segundo Neira, da FE, a unidade criou uma comissão para “estudar a movimentação dos alunos como um todo dentro do curso”. Ele explica que o objetivo é entender os caminhos que os alunos fazem durante a graduação, incluindo, por exemplo, quais disciplinas optativas eles escolhem, para garantir que o maior número possível deles conclua o curso e receba o diploma. “Fizemos uma pesquisa com os egressos, entrevistamos os egressos dos últimos dez anos. A partir das informações sobre o desempenho profissional, a carreira, fizemos mudanças no curso. Para torná-lo mais interessante”, afirmou. “Nos preocupamos bastante com a evasão, estamos sempre tentando melhorar.”