Como você, meu caro leitor, se imagina aos 90 anos? Já parou para pensar como será sua vida nesta idade? É uma reflexão distante para muitos, mas lhe apresento um exemplo de Dona Guila, que aos 90 anos não parou nem durante a pandemia do novo coronavírus.

Nascida em Pindorama, cidade de cerca de 16 mil habitantes próxima à Cantanduva e radicada em Junqueirópolis, cidade que segundo ela chegou quando “tudo ainda era mato”, Dona Guila exibe com orgulho as medalhas conquistadas no vôlei. “Eu amo jogar vôlei, não sei se depois que tudo voltar eu vou aguentar jogar”, disse ela.

O tempo todo da entrevista, Dona Guila se queixa da falta que sente dos grupos da terceira idade. “Essa doença me fez ficar trancada. Eu amo dançar, ir pros bailes, participo do coral, ia ao baile”, disse ela, aos risos, ressaltando a saudade dos bailes.

Mas pensa que ela parou suas atividades durante a pandemia? Que nada! “Acordo logo cedo, como alguma coisa, fico andando na horta de casa, espero a comida abaixa, sento na varanda o começo a bordar. Eu não consigo ficar parada olhando sem fazer nada. Faço meus bordados e adoro isso”, disse a senhora, exibindo seus inúmeros bordados estendidos em um sofá.

Segundo sua filha, já foram mais de 70 peças bordadas. Mas Dona Guila não faz ideia. “Eu não contei, vou fazendo. Pode olhar que tudo isso sou eu quem faço. Eu sou canhota, quem conhece de bordado sabe ver quem faz ponto com a direita ou esquerda, e da pra perceber que esses desenhos todos foram feitos por uma canhota. Cada desenho que faço existe algo de diferente”, explicou ela exibindo um bordado de coração.

Dona Guila exibe o resultado de seus dias ‘trancada sem os bailes’ com orgulho. Ela faz questão de exibir sua caixa de agulhas e linhas. “Eu compro linha de todas as cores. O desenho que as pessoas me pedem eu consigo fazer. Eu vou, escolho a cor, coloco na sacola, sento ali fora e começo a fazer”, diz ela mostrando uma caixa e uma sacola extremamente organizadas.

Quando perguntada o que vai fazer com todos esses bordados, Dona Guila, com seu bom humor peculiar diz: “Eu dou tudo pros meus netos, bisnetos, só passar aqui que eu dou. Caso me convidem pra algum aniversário, eu já tenho o que dar também”, disse ela gargalhando.

A senhora lembra-se de um rapaz que passou perguntando se ela fazia as peças para vender, Dona Guila é enfática. “Por enquanto não vou vender. Se alguém me perguntar como faz, só vir aqui que eu ensino também”, ressaltou.

Mas o que ela faz quando sente a cabeça doer ou quando não está fazendo alguma coisa? Ela responde: “Quando a cabeça dói um pouco eu vou lá à geladeira, pego um como de vinho e jogo pra dentro. Quem não gosta de um vinho gelado, não é? Mas não bebo muito, só meio copo (neste momento Dona Guila fez com uma das mãos um sinal que era um copo cheio). O pessoal fala que eu vou ficar bêbada, fico nada, sento e fico tranquila”, disse Dona Guila.

Dona Guila teve oito filhos, seis estão vivos. Além dos filhos, ela tem 14 netos e cinco bisnetos. A senhora lembra de uma história bordando para um dos netos. “Um dia fui escrever o nome de um neto em uma toalha. Mas escrevi ‘Duardo’ ao invés de Eduardo. A minha sorte foi que eu deixei um espaço onde cabia a letra E”, disse ela.

Maria de Oliveira Vicentine, quarta filha de Dona Guila disse que não está sendo fácil segurar ela em casa durante o isolamento social. “É difícil, mas ela se ocupa bem. Antes da pandemia ela chegava dos bailes 3h da manha, ia sozinha. Às vezes ela senta e começa a bordar, não quer nem almoçar. Se eu chegar à idade dela queria ter o mínimo de animo como o dela”, concluiu Vicentine.