O deputado Alessandro Molon (PT-RJ), relator do marco civil da internet, defendeu nesta quarta-feira (6) a neutralidade da rede, um dos pontos controversos para a votação do projeto. Segundo ele disse em comissão geral no Plenário da Câmara, provar o marco civil sem neutralidade “é preconceito contra pobre”. Isso porque, explicou, ao oferecer planos baratos (apenas para enviar e receber e-mails, por exemplo), as empresas não forneceriam uma experiência completa aos usuários.

A nova versão do parecer foi apresentada na terça-feira (5) e está em discussão na Casa antes da votação, que deve ocorrer apenas na próxima semana, segundo lideranças do governo. 

Arte/UOL

O conceito de neutralidade na rede diz que as empresas de telecomunicações não podem fornecer pacotes que discriminam os tipos de aplicações utilizadas pelo internauta. Por exemplo: uma operadora não poderia vender um pacote que permita acesso ilimitado a determinada rede social por um valor mensal.

Durante sua fala, Molon citou um estudo dizendo que pessoas com renda mensal de até um salário mínimo e que usam a web acessam mais vídeos do que e-mail. “Vídeo na internet hoje em dia não é lazer. É acesso à educação.”

O deputado também ressaltou que a questão da neutralidade não afetará a possibilidade de as operadoras venderem planos de diferentes velocidades. “O marco civil não proíbe a venda de bandas diferentes aos clientes. Esses pacotes continuarão existindo.”

Infraestrutura
O deputado federal Eduardo Cunha (RJ), líder do PMDB na Câmara, fez ressalvas em relação à questão da neutralidade. “Todos nós somos a favor. Não tem ninguém aqui [no Plenário] que ficará contra […]. Dizer que todos têm o mesmo direito é um discurso muito bonito”, afirmou, indicando que na prática a proposta não é viável.

“É como dizer que todos terão energia elétrica de forma igual. Se você usar 50 aparelhos de ar condicionado, 24 horas por dia, vai pagar a mesma coisa que quem só acender uma lâmpada em um quarto. Sem contar que o ar condicionado, sendo usado por todos, vai fazer com quem não o utilize passe a usá-lo”, comparou. Ele também deu como exemplo o pagamento de uma mesma taxa de gasolina, para quem rode 10 km ou 2.000 km ao mês. “Vou andar de carro o dia inteiro.”

Segundo ele, esse tipo de ação (igualar a oferta) criará uma demanda de infraestrutura que não poderá ser atendida. “O empresário não vai trabalhar para perder dinheiro. Então não vai fazer [atender à demanda], e o serviço vai congestionar. Vai cair tudo.”

Ele disse que na área da telefonia o país vive uma “ilha da fantasia”, na qual os usuários falam por uma hora no telefone. “Os planos ilimitados congestionaram [a infraestrutura] de celular no Brasil e acabaram derrubando as ligações. Com a internet não será diferente.”

Alterações
Na terça-feira (5), Molon fez alterações em pontos do marco civil, que ainda não são unanimidades na Câmara, como a obrigatoriedade de empresas estrangeiras de manter datacenters no Brasil. Em discurso nesta quarta, o relator fez questão de ressaltar que está aberto para ouvir sugestões sobre vários pontos do projeto, menos a neutralidade. “Nossa tarefa é separar assunto por assunto. Não confundamos essas discussões com a proteção ao ‘coração’ do projeto, que é a neutralidade.”

Ao resumir a proposta do marco civil, o deputado disse que está amparado em três pilares: a neutralidade, a liberdade de expressão e a garantia da privacidade do usuário. Sobre esse último item, foi destacada a evolução dos serviços de internet, a ponto de companhias venderem informações de navegação sem que as pessoas estejam cientes.

“A tecnologia permitiu avanços que se não forem limitados, eles acabam com a privacidade do cidadão. Até pouco tempo atrás, nosso comportamento de navegação era vendido sem que soubéssemos, e nosso projeto proíbe isso”, disse.

O marco civil também estabelece que os provedores de aplicação (redes sociais, por exemplo) apaguem informações de usuários quando, por exemplo, encerram um perfil em determinado serviço. “Alguns provedores não apagam essas informações, apenas as retiram do ar”, afirmou, ao explicar que a medida protege o direito do internauta à privacidade.

Eduardo Parajo, presidente da Abranet (Associação Brasileira de Internet) e membro do CGI (Comitê Gestor da Internet), defendeu que o marco civil seja baseado em princípios, e não em detalhes. “O diabo mora nos detalhes e, quanto mais detalhes houver no projeto de lei, mais brechas teremos”, afirmou. Parajo afirmou ainda que, quanto mais a tecnologia se sobrepuser à lei, mais ela se tornará obsoleta.’