A ciência confirma o que muitas famílias já sabem: crianças que frequentam creches estão mais suscetíveis a doenças como pneumonia, meningite, sinusite e otite. E a situação é pior para os filhos de famílias de baixa renda que ficam em creches públicas.

Longe de estar relacionado ao amor da mãe ou ao cuidado da avó, esse quadro é resultado de diversos fatores, todos relacionados a questões financeiras –entre eles, a maior incidência da bactéria pneumococo, cuja vacina só deve estar disponível gratuitamente no próximo ano na rede pública.

“Frequentar creche abaixo de dois anos é fator de risco”, diz Marco Aurélio Safadi, membro do Departamento Científico de Infectologia da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria). “Especialmente na rede pública, onde há um número maior de crianças em cada sala e maior chance de entrar em contato com a bactéria.”

Nos últimos dez anos, diversos estudos registraram a alta incidência do pneumococo entre crianças de creches públicas. Em Salvador (BA), 69,7% carregam –e transmitem– a bactéria. Goiânia (GO) registra 57,6%, e São Paulo, 35%.

Em Fortaleza, o percentual chega a 71%, registrado em pesquisa de Luís Carlos Rey, professor de pediatria do Departamento Materno-Infantil da UFC (Universidade Federal do Ceará). “Havia creches com quase 100% de colonização [presença da bactéria]”, diz Rey. “Em todos os países, as crianças de creches apresentam taxa de colonização acima da média da população. Mas em nenhum outro país temos esse nível.” Entre crianças saudáveis recrutadas em postos de saúde (incluindo as de creche e as que ficam em casa), a média é de 49%.

Fatores

Portar a bactéria não significa necessariamente ficar doente por causa dela –há outros fatores que desencadeiam as doenças, como infecções virais prévias ou aumento de secreção nasal. Mas sabe-se que, onde sua presença é maior, é maior também a incidência das doenças relacionadas a ela.

“Temos uma taxa 50% maior de pneumonia entre pobres do que entre ricos”, destaca Rey, referindo-se à chamada pneumonia comunitária, forma mais branda e muito comum da doença, que gera grande demanda nas alas pediátricas dos hospitais públicos.

Luiza Falleiros, chefe da seção de pesquisas e trabalhos científicos do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, lembra que há outros fatores associados ao aparecimento de doenças causadas pelo pneumococo. “A criança [das classes sociais mais baixas] tem mais pneumonia também porque é menos agasalhada, tem menor aporte protéico. É justamente a que mais precisa de uma vacina”, afirma. “A criança de maior poder aquisitivo tem quarto bem ventilado, ensolarado, maior proteção e mais condições de resolver bem uma doença.”

Contra esses problemas, resta aos pais das crianças que ainda não tomam vacina contra pneumococo fazer o básico: manter a carteira de vacinação em dia. Evitando outras doenças, reduzem-se também as chances de surgimento de pneumonia, meningite e otite média aguda.

Falleiros lembra ainda um fator de risco que independe de classe social: o tabagismo. “Fumar dentro de casa aumenta muito o risco de doenças respiratórias. E há cigarro na casa do rico e na casa do pobre.”