O ajuste fiscal em andamento mostra a grande dificuldade em cortar despesa no Brasil. Isso ocorre em grande parte porque a sociedade brasileira está viciada em favores governamentais, em privilégios e em subsídios. Os políticos não são capazes de reduzir as transferências públicas. Criou-se uma dependência exacerbada do Estado como se essa fosse a solução para combater a desigualdade e a pobreza no país.

Um ponto importante a ser destacado quanto à dependência pública é a ideia predominante no Brasil de que o governo precisa simplesmente ir colocando recursos em áreas como, por exemplo, a saúde, a educação e a seguridade social e isso basta para combater a gritante desigualdade social. Não é por ai.
Não há uma correlação direta imediata entre montante de gastos e eficácia de resultados. O Brasil gasta em educação, por exemplo, volume de recursos equivalente ao de alguns países mais desenvolvidos. Mas, os resultados são pífios. Por conta disso, venho propondo que o país troque seu sistema orçamentário incremental pelo sistema conhecido por “orçamento base-zero”. Essa inovação seria um instrumento para apurar a qualidade dos gastos em todas as áreas da administração pública. Certamente muitas despesas se mostrariam injustificáveis. Através desse mecanismo é possível analisar periodicamente a relação custo-benefício dos programas. Se o retorno não é adequado o programa acaba ou tem sua verba reduzida. Sobraria dinheiro para financiar outras áreas. Simples assim.
Educação e saúde gratuitas são fundamentais para combater a pobreza. Mas, não dá para aceitar a educação e a saúde públicas que temos frente a nossa carga tributária de país rico. A questão que deve ser colocada em relação às despesas nessas e em outras áreas governamentais é que precisamos ter critérios de avaliação da eficiência e eficácia dos dispêndios, visando que se tenha o máximo de retorno em cada real aplicado.
Cumpre dizer que essa questão não se relaciona apenas com os gastos direcionados à população mais pobre. Há os privilégios relacionados a grupos econômicos que articulam seus lobbies no Congresso no sentido de mantê-los. A indústria automobilística e a Zona Franca de Manaus, por exemplo, vivem de favores há décadas no Brasil e ninguém questiona a fundo essa situação. Os recursos absorvidos nesses dois casos dão retorno adequado ao país? Dinheiro aplicado neles não poderia ser utilizado em outras áreas, como a saúde, por exemplo?
O país chegou esgotou sua capacidade de tributação. Não dá mais para colocar o ônus nas contas do contribuinte sempre que precisa fazer ajuste fiscal, aumentar a dotação dessa ou daquela área ou financiar novos programas. É preciso combater a desigualdade sim e para isso os gastos com a seguridade, educação e saúde são fundamentais. Mas, o foco deve ser outro. O foco agora deve ser o combate ao desperdício e a análise constante da relação custo-benefício das despesas. Manter programas por inércia tem um preço e nós estamos pagando caro por isso.
O país precisa começar a focar o lado da despesa e o “orçamento base-zero” é uma inovação que inclusive pode contribuir para gerar um ambiente favorável para o setor produtivo ser mais eficiente, mais competitivo. Aliás, essa eficiência seria determinante para reduzir as desigualdades de maneira efetiva porque ela ocorreria com base no trabalho qualificado e na busca constante da elevação da sua produtividade.

*doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA) e professor titular de Economia na FGV (Fundação Getulio Vargas).